quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Brincar à energia barata


Longe vai o tempo em que grande parte da electricidade que o país consumia era produzida em barragens.

Actualmente, mais de 75% da energia eléctrica que utilizamos é gerada em centrais termoeléctricas a carvão e a gás natural, combustíveis que o país importa a preços do mercado. E os preços do carvão e do gás mais do que duplicaram ao longo do último ano, originando um tremendo agravamento nos custos de produção de electricidade.

Por outro lado, o nosso país tem vindo a apostar – e bem – no aproveitamento das energias renováveis e no desenvolvimento de tecnologias mais limpas, como a cogeração. O investimento nestas tecnologias é realizado por operadores privados, que constroem parques eólicos e centrais solares mediante a garantia de que a electricidade verde é paga a tarifas atractivas, que muito justamente premeiam os seus benefícios ambientais.

Ora, se todos estes custos fossem levados em conta, as tarifas de electricidade aumentariam no próximo ano 40%. Acontece que – fazendo tábua rasa do princípio do utilizador-pagador – o governo decidiu que o aumento do preço da energia eléctrica em 2009 será de apenas 4,3%. Dez vezes menos. Simpático não é?

O problema é que não há almoços grátis. Os produtores de electricidade não são instituições de solidariedade social. E o resultado desta política de faz de conta é a explosão do chamado défice tarifário, uma dívida dos portugueses para com os produtores de electricidade, cujo valor ultrapassa já os 2.000 milhões de euros. Um montante astronómico, que teremos que pagar e com juros.

Só que esta dívida não será paga em 2009, ano de muitas eleições, porque o governo socialista não está disposto a suportar o custo político de um aumento realista do preço da electricidade. A factura há-de ser paga mais para a frente.

Por outro lado, embora não hesite em recolher os louros da aposta nas energias renováveis, o governo socialista não está disposto a pagar a sua factura. E por isso decidiu que os apoios aos produtores de electricidade verde também não serão pagos em 2009. A factura há-de ser paga mais para a frente.

O governo e o “regulador” podem assim vir dizer que em 2009 a factura da electricidade vai aumentar apenas 1 euro por mês, ainda que essa seja uma mensagem falsa e profundamente errada, sob o ponto de vista da utilização racional de energia.

É muito socialista esta lógica de chutar os problemas para a frente. À conta da intromissão governamental nos preços, cada português ficará no próximo ano a dever mais de 200 euros em electricidade. Uma dívida que há-de crescer indefinidamente, enquanto não houver coragem política para enfrentar o problema de frente.

E o problema não se resolve atirando a dívida para o futuro ou obrigando os contribuintes a pagá-la, de forma encapotada, através de impostos.

A electricidade tem que ser paga por quem a consome, sem prejuízo da criação de um mecanismo de apoio social, de que deverão beneficiar apenas os mais carenciados.

Até quando vamos continuar a brincar à energia barata?

Provavelmente até que a bomba nos rebente nas mãos.

João Castanheira

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